Em junho de 2004, Jum Nakao, designer brasileiro, descendente de japonês, fez história no Brasil, com a sua apresentação no SPFW, que ficou conhecida como: “Desfile do papel” ou como Nakao intitulou “A costura do invisível”. Esse desfile foi considerado um dos mais importantes dos séculos, e também o desfile brasileiro que mais repercutiu no mundo. Porém essa seria a última coleção desfilada por Jum, antes de encerrar sua marca.

Vamos entender mais sobre o que foi esse desfile, e por que ele foi tão repercutido ? Confira!

As peças foram confeccionadas em diferentes gramaturas de papel, e milimetricamente modeladas nos corpos das modelos, além de Jum ter utilizado técnicas japonesas para fazer renda, por corte a laser e a texturização do material. Para as construções das roupas e dos cenários, foi necessário em torno de uma tonelada de papel vegetal, além disso, foi um trabalho árduo, pois envolveu mais de 200 funcionários, resultando em mais de 700 horas para o desenvolvimento das peças.

O desfile foi inspirado na moda do século XIX, com roupas de bonecas “Playmobil”, contendo delicadas peças brancas, e no final do desfile, as modelos surpreenderam o público com a performance, pois foram obrigadas a rasgar as roupas que estavam utilizando na frente de todos. A plateia inteira se chocou, e até mesmo lágrimas rolaram pela destruição das roupas.

Por quê rasgar as roupas?

O desfile foi um manifesto contra a globalização do mercado, criticando a demanda crescente por moda rápida e barata, que muitas vezes desconsidera a ética e a dignidade dos trabalhadores envolvidos na produção. Isso ameaçou a moda nacional brasileira daquela época, que continha estilistas como Ronaldo Fraga, Gloria Coelho, Alexandre Herchcovitch e Reinaldo Lourenço, pois entre as décadas de 1980 e 1990 eles construíram uma identidade que se projetava internacionalmente, da qual foi destruída pela chegada das fast-fashions e dos tecidos mais baratos trazidos da China, consequentemente, gerou uma pressão nacional em cima dos estilistas, fazendo com diminuíssem o preço e a qualidade de suas produções para disputarem no mercado. Mas, Jum Nakao se recusou a seguir tais demandas e encerrava definitivamente sua marca, rasgando as peças que haviam sido criadas, como representação dos sofrimentos pelos quais a moda nacional passava.

“Por isso, decidi colocar tudo em papel, a matéria mais frágil, transitória e efêmera, que não tem valor nenhum e seria rasgado ao final” – NAKAO

A Costura do Invisível ganhou o título de desfile da década pelo SPFW em 2005, na cerimônia que celebrou os dez anos da semana de moda nacional, por votação popular e de júri, além disso, foi reconhecido como um dos maiores desfiles do século pelo Museu de Moda da França (Musée Galliera) em 2006.

PARA REFLETIR…

Nos dias de hoje, a mensagem de Nakao ressoa ainda mais fortemente. A indústria da moda continua a ser marcada pelo fenômeno da “fast fashion”, que prioriza a produção rápida e barata de roupas em detrimento da qualidade, sustentabilidade e ética. Este modelo de negócios tem um impacto ambiental devastador, contribuindo para a poluição, o desperdício e a exploração dos recursos naturais. Além disso, perpetua práticas laborais injustas, com trabalhadores em fábricas, muitas vezes em condições deploráveis e com salários irrisórios.

A obra de Nakao, ao usar o papel como matéria-prima para suas criações, desafia a percepção do valor e da permanência na moda. Ele nos convida a refletir sobre o que realmente importa: a durabilidade e a história das peças que vestimos ou a rápida obsolescência ditada pelas tendências passageiras?

Ao olharmos para o futuro, a mensagem de Nakao nos inspira a reavaliar nossas escolhas de consumo e a apoiar iniciativas que buscam transformar a indústria da moda em um setor mais justo e sustentável. Em um mundo onde o impacto ambiental e social das nossas ações é cada vez mais evidente, o legado de Nakao é um chamado à ação para todos nós.

E vocês, já conheciam a história desse desfile? Comentem aqui o que acharam!